“Não preciso ter o David com uma braçadeira em campo, porque a postura dele é de capitão”

A definição de Dorival Júnior ajuda a entender a importância de David Luiz para este Flamengo que está a 90 minutos de reencontrar o caminho dos troféus após as frustrações de 2021. Se a temporada ficará marcada pela recuperação sob o comando do treinador e pela volta por cima de Pedro, o zagueiro divide com a dupla o protagonismo como a peça que mantém o equilíbrio e indica caminhos nos bastidores do Ninho do Urubu. Na hierarquia da faixa de capitão, David Luiz é apenas o terceiro entre os titulares, atrás de Everton Ribeiro e de Gabriel. No vestiário, porém, habitualmente é dos que tem voz mais ativa. Se multiplica no papel de agregador entre as diferentes personalidades e afinidades normais em um elenco com 30 jogadores, é praticamente um mentor dos mais jovens e usa toda experiência de uma década e meia de Europa em um tom ajustado entre cobrança e carinho. Foi David Luiz quem aumentou o volume do sinal de alerta ainda no fim da temporada passada ao cobrar amadurecimento e mudança de postura após os vices da Libertadores e do Brasileirão. Fosse no microfone ou no vestiário, o defensor entendeu que era necessário subir o tom para que o 2022 rubro-negro fosse diferente. Tem dado certo. – No futebol você tem quer ter brio, força de vontade e esse grupo precisa amadurecer e crescer. São essas as lições para o ano que vem – disse em entrevista na ocasião antes de fazer discurso ainda mais firme no vestiário. Não por acaso, era David a quem Paulo Sousa muitas vezes recorria para dialogar sobre o primeiro semestre complicado que o time teve e até buscar uma pacificação em alguns momentos. Nada, no entanto, foi capaz de colocar o trabalho do português nos trilhos, e a chegada de Dorival Júnior foi importante também para que o setor defensivo se ajustasse. Foi sob o comando do novo treinador que David Luiz passou a apresentar o nível que se esperava desde sua chegada, em setembro de 2021. Ao lado de Léo Pereira, subiu de produção e fez valer o papel também de líder técnico:

– O David resgatou a confiança, o prazer e a satisfação de estar atuando. Esse é um ponto importante. Ele sabe a importância dele dentro do nosso elenco (…) Tem muitos capitães que não assumem suas funções, e tem outros que não precisam dessa braçadeira para fazer a diferença. O David é um desses – disse o treinador.

A postura passa muito pelo senso de responsabilidade que David Luiz apresenta sempre que necessário no período em que está no Flamengo. Se os posicionamentos verbalizados chamam a atenção, o zagueiro também se comunica com atitudes que estreitaram o relacionamento com o torcedor.

Seja na porta do Ninho, no Maracanã ou, principalmente, em viagens, ele é quase sempre quem fica mais tempo atendendo aos pedidos para fotos, autógrafos e até vídeos com mensagens de feliz aniversário.

Dorival fez elogios rasgados ao comandado após a vitória sobre o Atlético-MG, no último sábado. Mais do que um defensor, o treinador vê em David um construtor de jogadas fundamental para abrir caminhos para este Flamengo:

– Ele tem aproveitamento interessante do momento certo de liberar um passe, momento certo de fazer o jogo se tornar mais cadenciado. É um meia jogando como zagueiro. É interessante essa função. Encontra passes de ruptura, passes em profundidade, o melhor momento para fazer nossa equipe iniciar criação. É um jogador quase completo pela capacidade e potencial que tem.

E não é somente o treinador que já se declarou ao zagueiro em público. É comum que companheiros exaltem o papel de liderança de David Luiz em entrevistas. Andreas Pereira foi às lágrimas ao agradecer o apoio após a final da Libertadores do ano passado. Fabrício Bruno e Léo Pereira, por exemplo, o trataram como fundamental para subida de rendimento ao longo da temporada:

“Agradeço também ao David Luiz pelos conselhos nos treinos, que é mestre em fazer essas bolas. Tenho o David como uma referência”, declarou Fabrício Bruno.

“É um jogador experiente que desde quando chegou só agregou ao nosso time. É muito importante não só para mim, mas para toda equipe. Conversamos bastante para minimizar os erros e não sofrer gols”, disse Léo Pereira

A fala quase sempre pausada e bem pensada característica de David praticamente hipnotiza os mais jovens. Desde a chegada ao Flamengo, é comum vê-lo ao lado de garotos da base seja após treinamentos ou nas viagens. Papel de “paizão” que ele desempenha com orgulho:

– Se não falarem bem de mim, dou uns cascudos neles. Desde que cheguei aqui, sempre mostrei e falei para eles que eu era muito acessível. Que eles poderiam chegar a mim e falar o que precisassem. Que não tinha essa barreira do tipo “não posso falar ou de onde ele veio”. Sei quanta gente me ajudou para eu chegar onde cheguei no futebol. E sei que a gente não chega em lugar nenhum sozinho. Tentei me colocar na posição deles e refletir da forma que eles refletem hoje. E tentar tirar ansiedade, medo ou receio de muitas coisas que acontecem numa idade mais jovem.

Jovem como era David Luiz no único título conquistado no futebol brasileiro: o Campeonato Baiano de 2005, aos 18 anos, com a camisa do Vitória.

Outros 17 anos se passaram até que o agora experiente David tivesse a oportunidade de mais uma vez erguer um troféu em seu país. Depois de ser campeão 20 vezes entre Europa e seleção brasileira, basta vencer o Corinthians, quarta-feira, às 21h45 (de Brasília), no Maracanã, para ficar com o título da Copa do Brasil.

Uma possível conquista que coroaria uma temporada marcada pelo comando de Dorival, os gols de Pedro, mas muito da liderança de David Luiz.

Fonte: GE